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terça-feira, 27 de fevereiro de 2007

Fim

A vida já não é o que um dia foi.
Meus dentes, ocos por dentro, se quebram ao menor sinal de resistência. Minhas mãos que um dia foram capazes de maravilhas, hoje não conseguem mais segurar um pincel. Parkinson. Minha mente prodigiosa se esquece às vezes se almocei ou não. E meus olhos há muito tempo se esqueceram como enxergar.
Meus netos e netas de vez em quando aparecem. Elas em suas mini-saias floridas e eles em bermudões com chaveiros e bottons. Piercings. Tatuagens. Os filhos não.
Um dia o mais velho veio. Chorou. E me disse que se arrependia de ter me deixado sozinha nesse lugar. Mas que a vida é assim mesmo, e sem o consentimento dos outros irmãos não havia como me trazer de volta. "A senhora sabe, cuidar de um velhinha custa dinheiro, e ninguém por lá é rico..."
Queria morrer. Mas não consigo. Queria ao menos que os netos viessem mais. E iluminassem meus dias ao menos por alguns minutos, com suas frases cheias de gírias e latas de Coca-Cola.
Queria que, enfim, os homens e mulheres que se escondem dentro deles não acordassem nunca...

4 comentários:

Juliana Marchioretto disse...

Ai, que texto lindo! Deu até uma pontada lá no fundo. Se eu permitisse, acho que cairia uma lágrima...

tô te linkando tb!

bjo

Sandra Regina de Souza disse...

Delicadamente triste... gostei!!! meu beijo inaugural

Anônimo disse...

lindo...
tenho um coração fraco por velhinhos...
:*

Marina disse...

Bonito texto!
Gostei daqui... Vou voltar com tempo pra ler os outros posts.

Obrigada pelos comentários!

Às vezes demoro mesmo um pouco pra atualizar... É a inspiração que foge entre os gostos/gozos cotidianos...

Beijosss