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quarta-feira, 4 de abril de 2007

Estocolmo

Cinquenta e dois dias hoje.
Sem banho. Sem cortador de unha. Sem creme dental. Sem um pente sequer.
Comida, só duas vezes ao dia. Um café ralo e sem açúcar de manhã acompanhado de um pão duro sem manteiga. No meio da tarde, uma gosma feita sabe-se lá de quê. Água regrada.
Escuro durante todo o tempo. Nenhuma janela, nenhuma lâmpada.
Sente o mofo úmido brotandodnas paredes e o cheiro de seus próprios excrementos se acumulando no buraco do canto da cela. Pelo barulho, já estava pra mais de meio. Moscas, aranhas, baratas e lacraias faziam parte da paisagem.
Ninguém lhe dizia nada. Não sabia o que queriam. Rico, não era. Muito menos importante ou influente. Pra dizer a verdade, não valia o esforço.
Cinquenta e dois dias. Ou cinquenta e três. Ou cinquenta e um. Não sabia bem. Se baseava no barulho que faziam durante as trocas de turno. E no ronco do guarda que ficava à noite.
Pensara em se suicidar, mas não havia nada que pudesse utilizar. Chão de cimento, paredes de reboco, nem uma aresta ou farpa. Pede a Deus todos os dias pela sua morte. Mas Ele com certeza já se esqueceu de sua existência.
Amanhã vai botar seu plano improvisado em prática. Vai se jogar no buraco. De ponta. Deve ter uns quarenta centímetros de diâmetro. Assim será impossível se virar. Impossível se salvar. Vai morrer afogado na própria merda. Um destino merecido pra quem, como ele, foi um merda a vida inteira.
Só uma coisa lhe incomoda: não saber quem ordenou seu sequestro. A única pessoa que algum dia fez algo pensando nele. Que se dispôs a dispender tempo, dinheiro e neurônios com vistas à sua pessoa. Quase chega a amar esse pobre diabo.
Amanhã vai pôr um fim a tudo isso. Mas agora vai dormir. E sonhar com um mundo de sol, sem lacraias, sem mofo e sem baratas.

Um comentário:

Juliana Marchioretto disse...

chegou a me incomodar, de tão real que poderia ser..

bjo